Abismo

ABYSS/ABISMO é o título da exposição da Komatsu que consiste em uma série de novos trabalhos especialmente criados para esta exposição individual, visando induzir um novo nível de consciência no espectador, antes de levá-lo a uma viagem imersiva. “O conceito de ‘abismo’ é algo que nunca conseguiremos entender completamente, um conceito que se abre para a possível existência de outras realidades, utópicas, distópicas.”, diz o artista. Para a Komatsu, a obra Leap into the void, de Yves Klein, é uma importante fonte de inspiração e motivo de reflexão. “Nesta obra, a figura suspensa, a meio salto, deixa a imagem inacabada e sem resolução. Representa uma alienação muito próxima daquela produzida pela situação política brasileira, comandada por um governo que escolheu sistemas de destruição (Necropolítica) para moldar mentes e criar sistemas de corrupção”, continua o artista. Surge a pergunta: estamos subindo à superfície ou estamos nos afogando?
Komatsu descreve seu trabalho como um reflexo do que ele percebe enquanto caminha pelas ruas e espaços urbanos. Os objetos e materiais que convergem para compor seu universo artístico podem ser vistos como convites à resistência social e à apropriação do território. As suas obras mantêm-se num constante estado de tensão, por um lado tendendo para uma condição de equilíbrio, por outro resistindo a esse equilíbrio. Isso é prejudicado pelo próprio esforço do artista, ou pelo esforço do mundo em derrubar, quebrar, desmontar ou explodir estruturas aparentemente sólidas. É nessa mudança entre energia criativa e entropia que reside a beleza do trabalho da Komatsu. O movimento (real, potencial ou meramente implícito) que caracteriza várias obras, aliado à escolha de materiais comuns – fragmentos, objectos abandonados, escombros – permite uma leitura empenhada e ideológica da sua obra.
A maioria dos trabalhos da Komatsu exige que mudemos nosso ponto de vista, pois eles estão abertos a várias leituras e podem ser compreendidos de diferentes maneiras. Se dermos um passo para trás e olharmos as coisas por outro ângulo, o que a princípio parecia ordenado se torna confuso e o que parecia caótico finalmente se revela em sua lógica perfeita.
Na sala principal da galeria encontram-se várias pinturas; essas novas experiências intituladas Sobre amanhã alvorada são fruto de pesquisas recentes da artista. O título é inspirado em uma frase que Komatsu encontrou no semanário Manchete, uma antiga revista que costumava escrever sobre Brasília e a construção de um sonho: uma nova capital trazendo modernidade, um Brasil moderno. A artista se reapropria dessa frase para falar do Brasil, durante a pandemia, e também em meio a diversas crises sanitárias, políticas, econômicas e sociais. “Naquele momento”, diz Komatsu, “todo mundo estava experimentando esse sentimento distópico devido à Covid e à situação política. De certa forma, lembrei-me do realismo e da pintura de gênero realista, um momento em que artistas e pintores começaram a retratar o cotidiano: não mais a burguesia, não mais o clero, mas passaram a retratar o ordinário e o cotidiano”. Durante o bloqueio, o artista começou a usar essa nova técnica e nova forma de fazer arte como uma ferramenta para investigar. As imagens das pinturas retratam o ambiente em que o artista está imerso: vislumbres de uma metrópole sombria e perturbadora que reflete um estado de espírito distópico e descrença no futuro.
Quimera (4) faz parte de uma série de obras criadas com pedaços de diferentes moedas que, reunidas, formam uma moeda inteira, uma metáfora para uma realidade global dominada pela demanda do mercado, informação manipulada, realidade aumentada e fake news. Uma linha de pensamento que Komatsu vem perseguindo desde 2018 com sua série Contrato Social, que consiste em cabeçalhos de jornais parcialmente cobertos por placas de chumbo. Os dois diferentes materiais da obra relacionam-se entre si, permitindo duas interpretações possíveis: por um lado, um jornal representa a difusão de informação, cria uma base para compreender a realidade mas também para manter um status quo; por outro lado, o chumbo – neste caso dobrado quase como um origami – é um material ao mesmo tempo protetor e tóxico. A folha de chumbo protege as informações escritas no jornal, mas ao mesmo tempo as esconde.

Dormente é uma instalação de parede feita de aço e vidro de segurança com uma corrente pendurada. De um certo ângulo, você vê o lado da corrente que é novo e brilhante, mas andando pela instalação, você vê o outro lado da corrente, enferrujado e arruinado. Através do vidro, cada lado da corrente é visível. Essa relação entre vidro e corrente serve de metáfora para falar de um limite social, explica Komatsu, “desde o fim da Guerra Fria o mundo começou a mudar e a compreensão de limites e fronteiras mudou. Não é uma barreira física, mas a forma como o sistema molda você para seguir e obedecer, retardando e limitando você. A corrente aqui é uma, mas seu corpo é dividido ao meio em duas partes. O que divide os dois lados é transparente e invisível; ainda presente”.
Ele fecha a exposição com o
work Untitled, uma obra que faz alusão a como a ideia de um mercado económico está por todo o lado e altera a nossa compreensão da realidade. “O mercado em geral corrompe ideais, desejos e conhecimentos. A frase escrita na placa de aço é inspirada em um discurso de Marilena Chaui, pensadora brasileira que critica o neoliberalismo capitalista”, comenta o artista.
20 de abril de 2023 – 16 de junho de 2023
Terça-feira – sábado 11h – 19h
Baixe o folder de imprensa aqui: tinyurl.com/abyssabismo
ANDRÉ KOMATSU
ABISMO / ABISMO

Dormente é uma instalação de parede feita de aço e vidro de segurança com uma corrente pendurada.

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